sábado, 28 de fevereiro de 2015

«Aos ricos, o favor da lei, aos pobres, o rigor da lei»

Num país onde os jornais se vêm confrontados com todo o tipo de obstáculos, a quem são sucessivamente retirados apoios e constantemente criadas novas taxas e impostos, a luta é quase desumana, sobretudo no que respeita aos jornais e rádios regionais.
Como se já não bastasse a «guerra» que por vezes estes têm necessidade de travar entre si, quando se implementam numa mesma área geográfica, quando se trata da conquista de mercado publicitário, na maior parte das vezes o seu único sustentáculo, como se vêm ainda na eminência de lutar contra “jornais” suportados por partidos políticos ou grupos económicos.
Como se também já não bastasse a falta de respeito e de reconhecimento das autarquias locais que entendem que o jornalismo regional deve ser aquele que apenas retrata as cerimónias de «corta-fitas», à boa moda dos velhos tempos, enfrenta agora a comunicação social regional um outro estorvo.
Vem isto a propósito de um jornal editado por uma cadeia de supermercados, que se iniciou como um meio de divulgar as promoções nas respectivas lojas e agora se apresenta praticamente como um jornal regional em vários distritos do país.
Não haveria problema se o mesmíssimo jornal, além dos seus produtos, e das tais notícias regionais, não estivesse também, literalmente, a roubar mercado publicitário aos jornais já ali implementados.
Perante um grande grupo económico, com fundos estrangeiros, que vende espaço publicitário ao «preço da chuva», que hipóteses podem ter os restantes jornais?
Mas a culpa é também dos investidores, que na sua maior parte procuram os jornais regionais para divulgarem as suas iniciativas, mas depois adjudicam a sua publicidade a este tipo de “jornais”, que lhes oferecem um preço baixo e têm meios para realizarem uma tiragem mais elevada e uma distribuição mais alargada.
Sabemos que várias queixas foram apresentadas à Entidade Reguladora da Comunicação Social sobre este tipo de «tubarões» que desta forma parecem pretender acabar com a imprensa local e regional.
No entanto, mais uma vez, parece que os «Grandes», os que dominam tudo e todos, não estão abrangidos por este «braço» da autoridade no campo da comunicação social. Afinal, a ERC parece mais interessada em receber as taxas anuais dos jornais e em exigir que sejam publicados direitos de resposta em casos que, levados a tribunal, este órgão superior considera completamente descabidos de publicação.
Mas é muitíssimo mais fácil punir os pequenos.
Face ao conhecimento que tenho das queixas que aquela entidade recebeu relativamente ao tal pseudo-jornal, espero ainda que a mesma tenha a hombridade de actuar ou de delegar a actuação em quem de direito, não atrasando a sua actuação até que seja já tarde demais para salvar ou proteger os órgãos de comunicação social locais e regionais.
No entanto, perante certos “silêncios” ficamos a pensar se não haverá mesmo segundas intenções.

P.S: Mais uma das minhas crónicas no Diário do Distrito.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

A força das palavras

Esta semana a notícia em Portugal e no mundo fez-se de morte. Da morte de uma doente a quem foi negado tratamento para a hepatite C e de um piloto jordano queimado vivo.
Como cidadã, apetecia-me aplicar a ambas as mortes um único termo: ‘execução’.
Como jornalista, não o posso fazer.
Se no caso do piloto jordano Muath al-Kasaesbeh o termo foi utilizado pela maior parte dos órgãos de comunicação social, no caso de Maria Manuela Ferreira, nenhum jornalista se atreveria a tal.
Infelizmente, esta é a força das palavras.
Se no nosso íntimo todos sentimos que Maria Manuela Ferreira foi vítima de uma execução perpetrada por vários, usar um tal termo iria, no mínimo, levar a responder numa acção em tribunal, e disso ninguém duvide.
Mas se não se pode utilizar a palavra que pretendemos (e sim, pode falar-se o que se quiser de liberdade de expressão, mas existem regras e limites que não podem ser ultrapassados, pelo menos por alguns), podemos usar a força das outras palavras para denunciar.
Infelizmente nem sempre os que deviam sabem, ou querem, utilizar esse poder.
Dou apenas um exemplo: quantas pessoas já passaram horas infinitas num hospital na urgência? Quantas não terão apresentando queixas no local ou até enviado um simples email para um canal televisivo ou um jornal nacional?
No entanto, os canais televisivos e jornais apenas começaram a realmente abrir os seus noticiários e fazerem capas depois de ocorrer mais do que uma morte seguida em alguns desses hospitais.
Mais uma vez, é a morte que vende.
Há quem se pronuncie contra este tipo de jornalismo, mas o que é certo é este atrai os espectadores e os leitores. É o que sai do normal quotidiano que faz a notícia. Daí que as mortes nas urgências dos hospitais só foram notícia e quase viraram histeria em termos mediáticos, depois de morrerem várias pessoas. Incluindo no Hospital Garcia de Orta, sobre o qual há vários anos que autarquias e comissões de utentes têm vindo a alertar para a situação caótica. Quando ocorreram duas mortes seguidas, então alguém a nível nacional tomou nota e fez a “notícia”.
E a “notícia” fez o caso, correndo tinta e quase rolando cabeças. Se algo mudou?
A TVI fez uma reportagem sobre o assunto e detectou que nada ou praticamente nada mudou nas urgências hospitalares portuguesas. Nem sempre o poder das palavras tem a força suficiente para mudar mentalidades e valores monetários dos que nos governam.